Memórias, Crônicas e Declarações de Amor

Cupido

Cláudio Lins

Eu vi quando você me viu
Seus olhos pousaram nos meus
Num arrepio sutil
Eu vi, pois é, eu reparei
Você me tirou pra dançar
Sem nunca sair do lugar
Sem botar os pés no chão
Sem música pra acompanhar
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu

Eu vi quando você me viu
Seus olhos buscaram nos meus
O mesmo pecado febril
Eu vi, pois é, eu reparei
Você me tirou todo o ar
Pra que eu pudesse respirar
Eu sei que ninguém percebeu
Foi só você e eu
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu
Ficou só você e eu
(Quando você me viu)

Vou-me embora pra Passárgada

Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Passárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Passárgada

Vou-me embora pra Passárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Passárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Passárgada

Todas as cartas de amor são ridículas

Álvaro de campos


Todas as cartas de amor são ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas. As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas. Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas. A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)

Amor
Anônimo

Hoje eu ouço o silêncio que suas palavras me causaram
Sinto o vazio que suas promessas me deixaram
Carrego em mim seu olhar, seu sorriso, sua paz
Mas não são tudo o que eu preciso, tudo o que eu quero

Me dei como as ondas que se entregam na areia
Você desprezou
Mas sei que o sentimento que bate no seu peito é amor
O amor que sente por mim.
Não tem como fugir, como mentir
Se um coração conversa com o outro é porque é amor

Para amar só basta fechar os olhos e senti o coração bater
O suor pelo rosto escorrer
As mãos esquentarem, as pernas bambearem
E mais: basta saber que você tem um outro coração que também bate por você.

Flor de Liz

Circuladô De Fulô

Flor de liz, não vá dizer
Se o vento tem compaixão
Pra te ver, te fazer esquecer
Da dor no coração
Eu sei que o farol
Te faz relembrar
Das noites com girassol
Talvez se você não chorar
Se você me deixar ajudar

Te tocar no coração
Saber que mais forte que a dor
É o amor que bate por ti
Amor do tão bom beija-flor.



Flor me diz, o que fazer
Se um beijo seu eu não posso ter
Se não fiz, por merecer
Quem sabe se eu te disser
Mas duro é o amor de partir
Se fica a olhar ele ir
Mas puro é o amor que está aqui
É só você se deixar sentir

Não temer só sorrir
Dizer que só quer ser feliz
Poder ver o pôr-do-sol
Com o beija-flor
Não mais com o girassol.

(Essa música foi uma das mais, talvez a única, significante para mim)